quinta-feira, setembro 13, 2007

Inverossímil.

“Pós Escrito ao Nome da Rosa” é o tipo do livro que engana. Pelo menos à mim, leitora mimada, que gosta de histórias, e não de histórias sobre como foram feitas as histórias. Mesmo assim, de pára-quedas, foi paixão às primeiras páginas – virtuais, pois, apesar de detestar ler no computador, meu bolso tem a mania de sempre falar mais alto que a ardência dos olhos.

É claro que escrever não tem fórmula, feliz ou infelizmente. Seria bem mais fácil se tivesse; porém, não seria tão desafiador e instigante, motivos que fazem desta batalha uma coisa tão inacreditavelmente libertadora.

Digo batalha, mas estou usando um ponto de vista completamente pessoal. Para os perfeccionistas, como eu, o ato de escrever pode se tornar uma atividade demasiada extensa e cansativa, pois o produto final nunca fica pronto. Sempre há o que lapidar; há sempre uma parte que poderia melhorar, se uma vírgula fosse retirada ou colocada (geralmente retirada, já que tenho verdadeira tara por vírgulas).

Queria mesmo é ser como Clarice, que não revisava nada do que escrevia. Para ela, depois do último ponto final, o texto não era mais mutável: estava morto. Não era mais dela, era de quem o lesse, com todas as frases dúbias e interpretações mil que este pudesse ter. Ou seja, já não era mais sua responsabilidade.

O estilo vomitado de idéias me atrai, pois não há a preocupação com beleza, sincronia, modelos. É como se fosse possível penetrar nos pensamentos do autor, e ser prontamente invadido pelo turbilhão de idéias que perpassa sua cabeça, sem censuras, ponderações ou qualquer coisa que o valha; é o mergulho no ser que escreve.

Voltando ao livro do Umberto Eco. Um trecho dele chamou a minha atenção. É exatamente isso que eu quero, este efeito envolvente que procuro quando escrevo:


“(...) Mas ao mesmo tempo eu queria, com todas as minhas forças, que se desenhasse uma figura de leitor que, superada a iniciação, se tornasse meu prisioneiro, ou melhor, prisioneiro do texto e pensasse não querer mais nada do que aquilo que o texto lhe oferecia. Um texto quer ser uma experiência de transformação para o próprio leitor. Você acha que quer sexo, e intrigas policiais em que no fim se descobre o culpado, e muita ação, mas ao mesmo tempo você se envergonha de aceitar uma venerável pacotilha, com mãos de mulher morta e ferreiros assassinos. Pois bem, eu vou lhe dar latim, poucas mulheres, teologia aos montes e sangue aos litros como no Grand Guignol, de forma que você diga “mas isso é falso, não aceito!”. E a essa altura, você já será meu, e experimentará o calafrio da infinita onipotência de Deus, que desfaz a ordem do mundo. E depois, se for honesto, perceberá a maneira como o atraí para a armadilha, porque, afinal, eu lhe dizia isso a cada passo, advertia-o claramente de que o estava arrastando para a danação, mas o interessante nos pactos com o diabo é que são firmados sabendo-se muito bem com quem se está tratando. Do contrário, por que ser premiado com o inferno?”


Pois toda história são várias histórias recontadas.

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